Público do Paraná rejeita os filmes produzidos no País
3 de julho de 2017
Não é de hoje que existe no meio cinematográfico a sensação de que o público paranaense, em especial o curitibano, é um dos piores no que diz respeito ao cinema nacional. Mas tal antipatia, que até pouco tempo era apenas uma suspeita, se confirmou com a divulgação do Anuário Estatístico do Cinema Brasileiro 2015, no final do ano passado.
O documento, produzido pela Agência Nacional de Cinema (Ancine), constatou que as produções nacionais respondem por apenas 7,9% da audiência paranaense, a menor média entre todos os estados do país. Curiosamente, os dois outros estados da região, Rio Grande do Sul e Santa Catarina, também aparecem entre os cinco estados que menos assistem filmes brasileiros, com 8,8 e 9,5%, respectivamente. Amapá (8,9%) e Rondônia (9,1%) completam a lista.
De acordo com Fernando Severo, um dos mais importantes nomes da Sétima Arte no Paraná, os dados reforçam uma imagem cultivada há tempos por muita gente, que indicam uma Curitiba europeizada, sem laços culturais mais fortes com o Brasil. Na Capital existem hoje 82 salas de cinema, o equivalente a 48,5% das 169 dos complexos existentes no estado.
“Essa é uma situação que nunca mudou. Desde que comecei, o Paraná, e Curitiba em especial, é um dos piores públicos para o cinema brasileiro”, afirma Severo, levantando ainda algumas hipóteses para tamanha rejeição do público local ao cinema nacional. “O cinema brasileiro é muito ligado à realidade social, e talvez o Brasil que apareça no cinema não tenha os valores sociais e econômicos que o público pagante queira ver nas telas. Quando se tem uma rejeição, significa que (o público) não se identifica com aquela imagem e linguagem.”
Paradoxalmente à rejeição aos filmes nacionais, o público paranaense registrou crescimento de 5,5% em 2015, chegando a 8,7 milhões de pessoas. No ano anterior, havia sido pouco mais de 8,2 milhões. Para Severo, contudo esse aumento seria reflexo não de um aumento na paixão da população pela Sètima Arte, mas de uma atenção maior dada ao cinema comercial.
“Eu acredito que (esse crescimento) seja mais pelo lado do cinema comercial, os blockbusters. No Paraná temos muitas redes, mas que exibem o mesmo estilo de filme”, diz o especialista, comentando ainda que nos últimos anos houve uma espécie de elitização do público no estado. “O cinema se tornou um lazer muito caro. O preço do ingresso ficou mais caro, tem ainda de pagar estacionamento no shopping… Então talvez seja uma elite econômica que ainda vai ao cinema.”
Cinema
Municípios com melhor relação habitante por sala de exibição*
Ribeirão Preto (SP) 19.038 habitante por sala (35 salas de exibição)
Campinas (SP) 20.423 (57)
Londrina (PR) 21.087 (26)
Porto Alegre (RS) 21.098 (70)
Curitiba (PR) 22.919 (82)
Filmes paranaenses batem recorde
Se a notícia ruim é a antipatia do paranaense pelo cinema nacional, a boa é que a produção local está em alta. Um relatório divulgado pela Ancine indica que foram lançados em 2016 cinco filmes cuja produtora era paranaense. Esse número é um recorde da série histórica iniciada em 1995 – até então, o recorde era de 2012, com três longas realizados naquele ano.
Com isso, o estado ficou no quinto lugar entre os estados cujas produtoras mais lançaram filmes, respondendo por 3,5% dos lançamentos de 2016.
São Paulo e Rio de Janeiro ainda formam praticamente um monopólio no setor, com 61 e 49 lançamentos, respectivamente, o equivalente a 77,5% do total. Rio Grande do Sul (7 filmes) e Pernambuco (6) completam o top five.
“Talvez o que tenha acontecido é que em 2015 e 2016 houve um número considerável de produções do Paraná com verbas de editais nacionais”, afirma o principal cineasta paranaense, Fernando Severo.
Apesar de não termos o estadual há vários anos, os realizadores conseguiram editais nacionais e isso talvez tenha aumentado a produção. Também teve edital da Fundação Cultural e isso deve ter impactado nos dados”, aponta Severo.
Cinema no paraná
Salas de exibição 169
Habitantes por sala 66.053
Público 8.680.898
Público por sala 51.366
Ingresso per capita 0,78
Participação de público dos títulos brasileiros 7,9%
Variação de público (2014-2015) + 5,5%
Município do Paraná com pior relação habitante por sala de exibição
Umuarama, que conta com uma sala de exibição para seus 108.218 habitantes
Municípios com melhor relação público por sala
São José dos Pinhais, que conta com cinco salas e alcançou no ano passado um público de 308.592 (61.718 por sala)
Dificuldade ainda é grande
O fato de as produções estarem em alta não significa que o setor tenha superado as dificuldades, como aponta Fernando Severo. Segundo ele, o maior desafio para aqueles que desejam fazer cinema no Paraná ainda é conseguir verbas para a produção.
“Um grande obstáculo é o Governo do Estado não ter feito prêmio estadual de cinema e vídeo e os editais da Fundação Cultural não são constantes, têm alguns hiatos. O cinema brasileiro não sobrevive sem o apoio estatal, como, aliás, acontece em 90% do mundo. Talvez só o cinema norte-americano sobreviva sem esse aporte.”